Imagino que a maior parte de vocês já ouviu falar na Ferrovia Madeira-Mamoré, a ferrovia do diabo, entretanto, peço licença para um breve resumo, para aqueles que não conhecem a história.
A foto abaixo é na zona portuária de Porto Velho, bem pertinho da antiga estação ferroviária.
Com o advento da Revolução Industrial no final do Séc. XIX, a borracha natural da Amazônia passou a ser muito valorizada, e iniciou-se o que se chama “Primeiro Ciclo da Borracha”, que teve seu apogeu entre os anos 1879 e 1912, e trouxe muita riqueza para algumas cidades amazônicas. Paralelamente, os países de colonização hispânica tornavam-se independentes e redefiniam suas fronteiras. Nesse movimento, a Bolívia perdeu sua saída para o mar. Como escoar a produção boliviana para os ávidos compradores europeus e norte-americanos, senão pela via fluvial amazônica? Mas… tinha uma cachoeira no caminho. No caminho tinha uma cachoeira… Na verdade, cerca de 20 cachoeiras num trecho de 300 Km dos rios Madeira e Mamoré, entre a atual cidade de Guajará-Mirim e Porto Velho. Surgiu então, na metade do Século XIX, a idéia de construir uma ferrovia ao longo do trecho encachoeirado dos rios. A partir de Porto Velho, a borracha e as demais mercadorias seguiriam de navios para Belém, primeiro pelo rio Madeira, e depois pelo Amazonas.
Linda a foto! Quequel, você está se revelando um misto de jornalista com professora de História!
Pois bem, a primeira concessão do governo brasileiro para a construção da estrada de ferro data de 1870, quando várias empresas estrangeiras tentaram, sem sucesso, iniciar a obra. Somente a partir de 1907 um megaempresário americano, após criar nos EUA a Madeira-Mamoré Railway Company e conseguir um contrato de uso da ferrovia por 60 anos, obteve sucesso na construção da estrada, entregando seus 366 km no ano de 1912, quarenta e dois anos após a concessão de construção, e 5 anos após retomadas as obras. Grandes empresas faliram e milhares de trabalhadores morreram nesses 42 anos. E faleceram à custa de uma estrada cuja razão de existir morria com o seu nascimento. Observem que 1912 é o ano de inauguração da ferrovia, e também o ano do fim do apogeu da borracha Amazônica. Sim, amazônica, porque a borracha em si é muito utilizada até os dias atuais. Falta de visão de futuro, ganância, gestão insustentável, falta de fiscalização, e outros comportamentos tão conhecidos da elite política e empresarial brasileira, permitiram que mudas da seringueira fossem contrabandeadas para a Malásia (biopirataria praticada pelos ingleses), que através de técnicas modernas de plantio e monocultura, invadiram o mercado mundial com preços muito baixos, inviabilizando a produção brasileira e boliviana. A estrada funcionou de 1912 a 1931, sempre dando prejuízos, e depois funcionou por mais alguns anos, até ser completamente substituída pelas rodovias que ligam Guajará Mirim a Porto Velho, na década de 70. Foi abandonada, e a floresta, implacável como sempre foi, tomou conta de quase toda a sua extensão. Alguns trechos foram recuperados para fins turísticos, e depois novamente abandonados. Ainda existem os funcionários da ferrovia, e os amigos da mesma, que lutam por sua recuperação. Até na Inglaterra ela tem amigos: a Madeira-Mamoré Railway Society.
Ponte sobre a estrada de ferro, na altura de Santo Antônio, Porto Velho.
Hoje, 98 anos após a inauguração da estrada, a cachoeira de Santo Antônio, distante apenas 7 Km de Porto Velho, ganha fama nacional, e passa a habitar apenas a memória daqueles que a conheceram. Para uns, ela morre pelo nobre motivo de contribuir com o desenvolvimento do Brasil, fornecendo energia para o Sudeste industrializado, e trazendo emprego e desenvolvimento para Rondônia; para outros, ela morre pela visão gananciosa e equivocada de gestores públicos, agarrados a um modelo desenvolvimentista ultrapassado. Para muitos porto-velhenses, a cachoeira de Santo Antônio será só saudade.
Abaixo, fotos da construção da Hidrelétrica de Santo Antônio, exatamente no local onde era a cachoeira. Pela velocidade da obra, é útil dizer que essas fotos são de 04/09/2010.
Essa placa dizia: ATENÇÃO! Devia seu um alerta sobre o risco das explosões próximas.
Neste mesmo local está a Igreja de Santo Antônio, e há algumas grutinhas como esta entre a igrejinha e o rio.
O meu tom acima foi nostálgico porque eu faço parte da turma dos conservacionistas, mas é preciso admitir que também coisas boas acontecem.
As usinas de Santo Antonio e Jirau – que também está sendo construída em Porto Velho – estão mudando a cara da cidade. A população tem crescido vertiginosamente, e com isso os preços das coisas aumentou, o trânsito ficou mais difícil, as opções de voos prá cá cresceram, a rede hoteleira vive lotada… enfim, a cidade é outra, dizem os que moram aqui. E vai mudar ainda mais. Os planos de minimização do impacto da implantação das usinas prevêem contratos com o governo local, com injeção de dinheiro para melhorias diversas. Melhorias urbanas, por exemplo, como colocação de semáforos nos cruzamentos (a zona central de Porto Velho tem 1 cruzamento a cada 100 m, e a maioria não tem semáforo), identificação de ruas com plaquinhas nas esquinas, e outras muitas melhorias. Não estou acompanhando, mas imagino que haja investimentos nas áreas de educação, saúde, segurança pública, cultura e lazer. Já ouvi dizer que a prefeitura anda se aproveitando prá culpar a usina por todos os males da cidade, e responsabilizá-la prá que ela faça tudo que os governos nunca fizeram antes. Nos planos cultural e urbanístico, já percebe-se alterações significativas, com a revitalização do patrimônio da Ferrovia Madeira-Mamoré, cujas fotos estão abaixo. Quando ficar pronto, Porto Velho terá um espaço público bonito e útil para o seu povo e os turistas passearem.
História interessante, Quequel. Obrigado pela dica!
Para quem se interessar, aqui está o link da Associação dos Amigos da Madeira-Mamoré, ou Madeira-Mamoré Railway Society. Vale a pena navegar nas fotos.
Um barco encalhado que continuará fazendo parte do local, que ainda está em obras.
O rio Madeira, na altura da estação e o barco que faz passeio turístico pelo rio, temporariamente parado devido às obras no seu porto de atracamento. Na curva do rio, lá no fundo, quase no centro da foto, a futura hidrelétrica de Santo Antônio.
Nessa foto, tirada num entardecer de maio, quase do mesmo lugar, dá prá ver melhor onde são as obras.
Prá despedir, nada melhor que uma estrada bonita, e um convite. Naquele morro, ao fundo, está o Café Madeira, barzinho com uma bonita vista do rio (de lá que eu tirei a foto acima), cerveja geladinha e música gostosa, selecionadíssima. Quem vem?
Roberto,
eu sempre entro através de Comunidade. Aí os primeiros são os posts mais recentes, e os que ainda não li vem marcadinhos em amarelo. Mas, prá quem entra com o Internet Explorer, ou só olha o cardápio de links à esquerda, deve ficar mais difícil mesmo de achar.
Obrigada pelo comentário.
Olá Pax, Roberto e Fátima Ribeiro, Obrigada pelo carinho. Não só eu, mas toda a família, nos orgulhamos muito de nossa Quequel. Aprovo tudo de positivo que dizem dela. Concordo em gênero, número e grau. Um abraço a todos vocês.
Prezada Maria das Graças,
Sua presença só aumenta o tamanho da filha. Seja muito bem-vinda.
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Abraços
Oi filha,
No meu tempo o desfile de 7 de setembro tinha outro nome. Era “Parada de 7 de Setembro”, e, curioso, só agora me dou conta, que eu jamais “marchei” antes do ginasial, que por acaso começou no ano de 1964. “”Marchei” nos 4 anos do ginasial e me sentia muito orgulhosa, sempre esperando pelo final, para saborear o delicioso “pão com salame, guaraná Coroa” . Bons tempos… Beijos.
um abraço, dona das graças!
pq diabo